Pescadores que vivem da pesca do camarão na Praia do Siqueira, em Cabo Frio e nas praias do Camurum e Mossoró, em São Pedro da Aldeia, estão há mais um de uma semana sem conseguir sair para a atividade. Não é mais possível ter acesso ao trecho da Lagoa de Araruama que passa pelo bairro. O local foi tomado por algas e por material orgânico, que, em algumas áreas, se estende por até 50 metros lagoa adentro. O material é semelhante a uma massa mole, de cor escura. Está concentrado em grande quantidade e não é possível passar por ele. O local virou uma espécie de mangue tomado por lama escura.
O problema é antigo, mas agravou-se nas últimas semanas, a ponto da ONG A Lagoa é Nossa, que defende a preservação ambiental da lagoa, dizer que o cenário configura o “colapso” da Lagoa de Araruama. “Esse material é esgoto, lançado nesse trecho da lagoa sem qualquer tipo de tratamento. A situação piorou por causa do calor e da alta temporada”, disse o coordenador da ONG, Pablo Santos.
As redes sociais da ONG estão cheias de imagens aéreas que mostram como o material orgânico e as algas avançaram na praia do Siqueira e em São Pedro da Aldeia. E que mostram, ainda, o despejo de esgoto sem tratamento no local.
O termo “colapso” para o trecho entre Cabo Frio e São Pedro da Aldeia também é usado pelo Comitê de Bacias Hidrográficas Lagos São João. Em nota enviada ao Manchete Lagos, o Comitê disse que prepara uma força-tarefa para fazer a limpeza e dragagem do material orgânico e algas das áreas impactadas. Além de obras imediatas para a captação de pontos de vazamento de esgoto. A força-tarefa ainda não tem data para começar a trabalhar. Vai reunir Inea, Agenersa, Prolagos, CAJ, bem como prefeituras de Cabo Frio, Iguaba Grande, São Pedro da Aldeia, Arraial do Cabo e Araruama.
O biólogo Eduardo Pimenta explicou que a situação é resultado de múltiplos fatores, incluindo o sistema de tratamento de esgoto a tempo seco. “Quando chove, a água da chuva se mistura com os efluentes, e a estação de tratamento não consegue dar conta, liberando tudo para a lagoa”, disse. Ele destacou ainda que a combinação de chuva, calor intenso e aumento da população na alta temporada agrava o problema.
Mas acrescentou: “De uma maneira geral, mais de 80% do corpo hídrico da Lagoa de Araruama está em boas e ótimas condições de balneabilidade. A ciência, o monitoramento do Consórcio Intermunicipal Lagos São João, do Comitê de Bacias, do Governo do Estado, do INEA, e todos os trabalhos de conclusão de curso, seja TCC, de mestrado de doutorado, têm mostrado isso”
A Prolagos, concessionária de água e esgoto que atua na Região dos Lagos, informou que o acúmulo de material orgânico no trecho citado tem várias fatores, como direção e velocidade dos ventos, movimento de marés, índice pluviométrico, altas temperaturas e baixa profundidade. E que o problema deve ser resolvido com a conclusão das obras de modernização da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) da Praia do Siqueira. Não há prazo para que a estação seja concluída.
Ao fim das intervenções, a unidade irá passar a operar dentro do modelo terciário, gerando ao final do processo água de reuso, que poderá ser utilizada para irrigação de jardins e outros fins. A primeira etapa da obra deve ser concluída no primeiro trimestre. O cronograma final está sendo revisado conforme a cessão do terreno, que está em fase avançada de tratativa com o município.
Enquanto isso, o pescador Afonso Guedes, que trabalha na praia do Camerum, em São Pedro da Aldeia, desabafa: “Não podemos mais usar a nossa lagoa”, disse. O barco dele está preso no material orgânico e ele não consegue retirar. “Acabaram com tudo”, disse.
Não tivemos retorno do Inea, nem da prefeitura de Cabo Frio sobre o assunto.
